domingo, 5 de março de 2006

“Não somos parvos!”

[A consciência que falta aos nossos governantes…]

Um grupo de 12 cidadãos subscreveu uma petição dirigida à AR com vista à promoção de um referendo sobre os projectos da OTA e do TGV. São precisas 75 mil assinaturas. Todas as decisões técnico-formais subjacentes a este processo serão decididas no dia 8 de Março, numa reunião no Secretariado Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral.

Carlos Abreu Amorim, docente na Escola de Direito da Universidade do Minho, é um dos subscritores. Segundo o professor,
“se, de facto, esta é a única forma de sermos esclarecidos – e nós, infelizmente, estamos a chegar à conclusão que sim, que, para provocar este debate indispensável para o país é preciso convocar um referendo através dos meios que a lei nos dá - então nós vamos fazê-lo”

Para justificar a necessidade deste esclarecimento, o professor apontou as seguintes razões:

­- “Maior investimento feito em Portugal”, cujo “primeiro mártir" foi, segundo o professor Amorim, o antigo Ministro das Finanças, Campos e Cunha;
­- Possibilidade de “derrapagem para mais do dobro” do seu valor orçamental;
­- Ausência de um enquadramento das obras “num modelo de desenvolvimento” para o país;
­- Existência de “estudos contraditórios” sobre o mesmo modelo de desenvolvimento­;


O professor Carlos Amorim acrescentou “ainda não ter percebido o modelo de desenvolvimento em que se insere” este investimento a pagar “pela actual e pela próxima geração. E lembrou que “entre os primeiros 16 países do Mundo com maior índice de desenvolvimento humano, só dois, a França e o Japão, têm TGV.”
O professor afirmou que o objectivo é, essencialmente, “obrigar o poder político a discutir e a explicar aos cidadãos aquilo que quer fazer.” “Nós somos gente que não gosta de ser tomada por parva”, concluiu.

(in Público, dia 4 de Março)

[Fala-se de crise para justificar os cortes nas despesas, os impostos, o desemprego… E para projectos megalómanos, típicos de uma herança que já Eça ridicularizava, a crise já não existe!]

4 comentários:

Pedro Teles disse...

Cara Sónia, n seja tao parcial. Em vez de falar em ficção pense na realidade o investimento público é uma das forma de relançamento da economia. quer um exemplo: o new deal americano que salvou os EUA qd estes se depararam com a maior crise de sempre. E sabe uma coisa, parece que resultou.

Eins disse...

Não faz qualquer sentido dizer-se que "o investimento público é uma das formas de relançamento da economia" e dar o exemplo do new deal americano para justificar a pertinência da OTA e do TGV em Portugal. Por várias razões... aliás, por tantas razões que vou só falar das mais óbvias.

O investimento público não gera estímulo à economia per si. Veja-se o exemplo do Euro2004, os casos dos estádios do Algarve, Aveiro e Coimbra, que com tão pouca receita gerada quer durante, quer após o Euro, demorarão eternidades a pagar-se (se é que alguma vez se vão pagar), tendo em conta que não têm uma manutenção propriamente barata...

Olhando para o TGV, acho que faria sentido uma ligação a Espanha, via Lisboa ou via Porto (a que fosse mais barata). Agora, uma ligação Porto-Lisboa? Com 4 ou 5 paragens??? Se melhorarem a linha do pendular nas zonas lentas (que serão cerca de metade do percurso) o Alfa atinge 220km/h e, com as mesmas paragens, demorará mais 20 minutos a fazer o mesmo percurso! Vale assim tanto a pena? Basta ir a Espanha, ver o preço dos bilhetes, e perceber que em Portugal será um transporte de elite, pelo menos no trajecto a que me refiro. Isso faz deste projecto um autêntico estádio Faro-Loulé.

O new deal americano assentou na construção de obras públicas, é certo, porque havia milhões de desempregados, ou seja, milhões de bolsos vazios, milhões de consumidores sem dinheiro para consumir. Aí o Estado correu o risco e assumiu o papel de empregador temporário, para pressionar positivamente a procura, via criação de salários onde não existiam (via consumo).

Se ainda não é visível a diferença gritante entre os dois casos, eu explico: quantos postos de trabalho serão criados pelos 2 projectos em conjunto, e até que ponto isso significará, em termos macroeconómicos, um aumento no consumo capaz de impulsionar a economia? Hummm... vão dizer-me que mil, dois mil ou 10 mil empregos são capazes disso? Garanto-vos que não. Nem 100 mil. Isso diminuiria em quase 1/4 o desemprego, mas não impulsionaria a economia. Porque no caso americano, milhões não tinham um tostão, e muitos mais milhões escusavam-se a gastar o que tinham porque, ao ritmo das falências, os produtos sofriam quedas constantes nos preços e porque, em altura de crise, no poupar é que está o ganho. Daí que uma solução como a adoptada faça sentido NAQUELE caso. Não no nosso.

Além disto (se o que foi dito acima ainda não for suficiente) há 3 formas que o Estado tem para pagar o que deve (ou seja, financiar-se... sim, porque o estado também tem que pagar, senão vai à falência... e depois?):
- emissão de moeda, que cria uma pressão brutal nos preços;
- desvalorização cambial, de forma a que a sua moeda valha menos nos mercados monetários, o que faz com que (comparativamente) os seus produtos sejam mais baratos no estrangeiro (o que também gera inflação, tal como a anterior); e
- política orçamental, ou seja, como qualquer gestão elementar, gerar receitas para cobrir as despesas.
Em poucas palavras, os E.U.A. tinham as 3 formas que referi ao seu dispor, e com a queda acentuada nos preços que se verificava, os efeitos "menos bons" de 2 das 3 políticas que referi não preocupavam. Ao invés, as políticas monetária (emissão de moeda) e cambial estão a cargo do BCE, o que nos retira 2/3 das formas de financiamento do Estado. Sobra a política orçamental, não esqueçamos que ainda há pouco tempo estava limitada pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento da U.E., que assenta no pressuposto (errado ou correcto, não é isso que está aqui em questão, apenas o facto de ser limitativo) de que o rigor orçamental dos Estados-Membros é factor essencial de crescimento sustentado da União. Mesmo não sofrendo as fortes restrições de há 2 anos atrás, não é completamente livre de ser utilizada, e não é eficiente. Basta pensar que é impossível pagar estes projectos através do aumento da receita (impostos) ou da diminuição da despesa (subsídios, segurança social, etc.).
Tudo combinado, o Estado vai à banca buscar guito para pagar comboios mais rápidos e aeroportos maiores.

Então é isto o investimento público? Porque será que ninguém (privado) se lembrou disto antes? Pedir dinheiro à banca para construir aeroportos e linhas ferroviárias supersónicas? Será porque... hum... não dá lucro? E sem lucro, só o Estado consegue ter crédito da banca, porque paga sempre. Seja com títulos da dívida, seja com edifícios, ou corte de subsídios, ou aumento de impostos. Mas (à banca) paga sempre.

Sónia Monteiro disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Sónia Monteiro disse...

Não podia ter respondido melhor! Clara visão da REALIDADE de Eins!Caro Pedro, não seja tao parcial.